Canal 1: o sistema de misturação absoluta

Como é de conhecimento de todos que acompanham a história do saneamento e do urbanismo no Brasil, o Plano de Saneamento implantado em Santos, a partir de 1905, pelo engenheiro Francisco Saturnino de Brito, introduziu o sistema de separação absoluta entre as águas pluviais e as águas servidas (esgotos).
Este sistema, preconizado em 1896 pelo engenheiro Ignácio Cochrane, então chefe da Comissão de Saneamento, consiste na implantação de sistemas distintos para drenagem e esgotos.
Desta forma, Brito concebeu os sistemas de esgotos e de galerias e canais de drenagem, que garantiram a possibilidade de urbanizar a Zona Leste de Santos, onde até então predominavam áreas inundáveis.
Um esquema do sistema de Canais pode ser visto na ilustração abaixo. Os canais do Plano de Saturnino de Brito são aqueles numerados. Os demais foram implantados posteriormente pela Prefeitura/Prodesan. Os canais que foram cobertos são identificados com a letra "C".

Como se pode observar, o canal que drena a bacia com maior área é o Canal 1, que recebe a contribuição dos canais 7, 8 e 9, que recebem contribuição dos morros do Jabaquara, Marapé e Santa Terezinha e dos bairros Marapé e José Menino, além de galerias provenientes de parte da área central e Paquetá, na região das avenidas Rangel Pestana, onde o canal é coberto e da Campos Sales, até a Bacia do Mercado.
Portanto, este é o canal que conduz a maior quantidade de água para o Estuário (Mercado) e para as praias (José Menino e Pompéia).
Alertado por um atento morador das proximidades, fui realizar uma vistoria detalhada pelo Canal 1 e seus contribuidores, nos últimos dias 5 e 6. Neste rápido survey, pude verificar estarrecido, que já não existe mais o sistema de separação absoluta na bacia deste grande canal.
Como se observa pelas fotos abaixo, tiradas em vários trechos entre a praia e a confluência das avenidas Senador Pinheiro Machado e Dr. Cláudio Luís da Costa (junto à A.A. Portuguesa), o leito do canal está infestado por algas e plantas aquáticas indicativas de elevada carga orgânica. Entre esta confluência e a Bacia do Mercado a situação é sensivelmente melhor.
A estiagem das últimas semanas, que fez com que as comportas do canal permanecessem fechadas, certamente contribuiu para aumentar a concentração de esgotos onde só deveria haver águas pluviais,
Observando as condições de outros canais contribuidores do Canal 1, pude verificar que a situação é pior no Canal da Avenida Moura Ribeiro, Canal 8 do Plano de Saneamento. Conforme fotos abaixo, este canal também apresenta infestação de algas e plantas aquáticas, sobretudo no trecho em que recebe a contribuição do pequeno canal da Rua Dom Duarte Leopoldo e Silva, no sopé do Morro do Marapé.
O que me parece mais provável é que a maior parte da carga orgânica esteja vindo desta área do morro, embora seja generalizado o lançamento de esgotos e outras formas de poluição, em outras áreas, como abordarei em outro post. 
Com base nesta grave situação, posso afirmar que não mais existe, na bacia do Canal 1, o sistema de separação absoluta. Ao contrário, parece ter sido implantado o sistema de "misturação" absoluta.
O resultado do abandono da separação absoluta pode ser observado, também, nos relatórios anuais da CETESB, sobre a balneabilidade das praias. Segundo a última versão, que relata as condições das praias em 2011, os pontos de amostragem próximos ao Canal 1, respectivamente na direção das ruas Frederico Ozanan e Olavo Bilac, apresentaram condição imprópria para banho durante 67% e 63% do ano passado, o que as fez obter classificação anual como Péssimas, segundo o órgão. 
As demais praias também não apresentaram boas condições, o que demonstra que a questão é genralizada.
A SABESP, empresa estadual responsável pelo sistema de esgotos e a Prefeitura, responsável pelo de drenagem, precisam dar respostas imediatas para esta grave situação, em especial quanto ao saneamento do Morro do Marapé e a fiscalização de lançamento clandestino de esgotos na rede de drenagem, que parece correr solta, enquanto ambas as partes não se entendem e não firmam o convênio aprovado pela Câmara Municipal, pela Lei Complementar N° 707/2010.
Aliás, as razões do não entendimento entre as partes não são conhecidas pela sociedade santista, que paga impostos para ter uma péssima gestão do saneamento, como se observa pelas imagens abaixo.
Não esgotei este tema e nos próximos posts darei mais detalhes e informações.
 Comporta do Canal 1 na Praia do José Menino (5/9/12)
 Canal 1 no Curvão do Marapé (5/9/12)
 Pontilhão da Rua Carlos Gomes sobre o Canal 1 (5/9/12)
 Trecho do Canal 1 entre a Rua Carvalho de Mendonça e o Curvão do Marapé (5/9/12)
 Trecho do Canal 1 entre a Rua Carvalho de Mendonça e o Curvão do Marapé (5/9/12)
 Trecho do Canal 1 entre a Rua Carvalho de Mendonça e o Curvão do Marapé (5/9/12)
 Trecho do Canal 1 entre o Canal 9 (Av. Barão de Penedo) e a Av. General Francisco Glicério (5/9/12)
Trecho do Canal 1 entre a Av. General Francisco Glicério e a Rua Carvalho de Mendonça (5/9/12)
 Trecho do Canal 1 entre a Av. General Francisco Glicério e a Rua Carvalho de Mendonça (5/9/12)
 Canal da Rua Dom Duarte Leopoldo e Silva, no sopé do Morro do Marapé (6/9/12)
 Descarga do Canal da Rua Dom Duarte Leopoldo e Silva no Canal 8, na Av. Moura Ribeiro (6/9/12)
Trecho do Canal 8, na Av. Moura Ribeiro, a montante da descarga da galeria de drenagem proveniente da Rua Romeu Aceturi (6/9/12)

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